Um avanço no combate à litigância predatória em Minas Gerais

Um avanço no combate à litigância predatória em Minas Gerais

O mês de outubro de 2024 trouxe duas boas notícias jurisprudenciais no combate à litigância predatória em Minas Gerais.

 A primeira delas foi a conclusão do julgamento do IRDR Tema 91 (Acórdão 1.0000.22.157099-7/002), no qual o TJMG fixou a seguinte tese jurídica: 

 "A caracterização do interesse de agir nas ações de natureza prestacional das relações de consumo depende da comprovação da prévia tentativa de solução extrajudicial da controvérsia".

 Conforme já decidiu o STF (RE 631.240/MG), a exigência de prévia tentativa de resolução extrajudicial da questão não viola o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição.

 E tal tentativa anterior ao ajuizamento pode se dar por qualquer canal oficial de serviço mantido pelos fornecedores de produtos ou serviços, a exemplo do SAC, PROCON, BACEN, agências reguladoras, plataformas públicas e até mesmo as privadas, além da notificação extrajudicial por carta ou via tabelionato.

 Decidiu o TJMG que deve-se aguardar o prazo mínimo de 10 dias para uma resposta.

 Portanto, considerando que praticamente a totalidade das demandas predatórias originam-se das relações dos consumidores com empresas dos mais diversos setores, a partir de agora, em Minas Gerais, não poderão os pedidos ser formulados diretamente ao Judiciário sem que o consumidor tenha tentado resolver a sua demanda administrativamente, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito por carência da ação ante a ausência de interesse processual.

 Já a segunda boa notícia foi o cancelamento da Súmula 38 do TJMG por meio do julgamento da Petição – Cível nº 1.0000.24.314679-2/000.

 Assim dispunha o enunciado da Súmula 38/TJMG:

 “Na ação declaratória de inexistência de dívida com negativa de relação contratual, pleiteada a tutela de urgência e preenchidos os requisitos do art. 300 do CPC/2015, a parte tem o direito subjetivo processual de concessão da liminar para abstenção ou exclusão do seu nome nos cadastros restritivos de crédito, pelo menos até ao julgamento da causa.”

 No estudo realizado pelo Núcleo de Apoio à Gestão de Gabinetes (NUAP), ressaltou-se o aumento de ações declaratórias de inexistência de débito de caráter potencialmente fraudulento e/ou predatório, muitas das quais valendo-se do enunciado da Súmula 38 para a obtenção de tutelas de urgência, deferidas de forma recorrente pelas Câmaras Cíveis de Direito Privado do TJMG.

 No julgado, argumentou-se, acertadamente, a desvirtuação da tutela de urgência na ação declaratória de inexistência de dívida com negativa de relação contratual nos casos reveladores de abuso do direito de ação.

 A Corte sustentou que a concessão de tutela de urgência para abstenção ou exclusão de inscrição em cadastro restritivo de crédito depende do preenchimento dos requisitos previstos no art. 300 do CPC e da observância da tese firmada pelo STJ no Tema Repetitivo 31 (REsp 1.061.530/RS).

 O Relator, Desembargador Edilson Olímpio Fernandes, ressaltou que:

 “(...) não tem respaldo no Enunciado da Súmula 38 do Órgão Especial, com a devida vênia, a concessão de tutela de urgência para obstar/cancelar a inscrição nos cadastros de proteção ao crédito com base na mera propositura de ação declaratória de inexistência de débito com negativa de relação contratual, ainda que no intuito de proteger o consumidor, de modo que não havendo a comprovação do atendimento de um dos requisitos do artigo 300 do CPC, não há como impedir-se a inscrição do nome da parte autora em cadastro de restrição de crédito.”

Salientou, ainda, que: 

 "invocação indiscriminada do Enunciado da Súmula 38 em prática de possível litigância predatória em ações declaratórias de inexistência de relação contratual, este egrégio Tribunal de Justiça já dispõe de instrumentos para alertar e combater práticas processuais abusivas, consoante salientado pelo NUAP, notadamente a Nota Técnica n. 01/2022 do Centro de Inteligência do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que aponta indícios de práticas predatórias e medidas para seu enfrentamento, as quais estariam sendo adotadas em julgados recentes deste Tribunal."

Concluiu pela "desnecessidade do Enunciado da Súmula n. 38 do Órgão Especial deste Tribunal de Justiça para assegurar à parte a concessão da tutela de urgência na hipótese em que o julgador considerar preenchidos os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil e a sua existência como estímulo à litigância predatória, forçoso concluir pela sua revogação."

 Já o NUAP concluiu que "a alteração ou mesmo o cancelamento da Súmula podem ser estratégias de combate às práticas atentatórias à dignidade da Justiça, o que reflete o espírito diligente dos aplicadores do Direito frente ao dinamismo das relações jurídicas".

Portanto, com tais novos entendimentos neste final de 2024, estão renovadas as esperanças de um 2025 com redução das lides temerárias em Minas Gerais, Estado que tanto sofre com essa prática de efeitos deletérios não só para os profissionais do direito, mas, notadamente, para o jurisdicionado que realmente enfrenta um conflito social e precisa da força pública para lhe acolher.

 

18 de outubro de 2024

 

Vinícius Lacerda

 

Fonte: não informado>

Data: 18/10/2024>

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